27 de set. de 2014

O que deveríamos aprender com as antigas máquinas de escrever

Assistindo o horário político obrigatório na TV e vendo políticos de conveniência que trocam de partido a toda hora, deparei-me com um pensamento que me intrigou – no que exatamente o Século XX foi tão diferente do nosso atual Século XXI?

É importante salientar que não acho o Século XX melhor, mas trago aqui uma reflexão para que você pense comigo no que realmente mudamos nas últimas décadas.

Quando penso na diferença entre datilografar numa máquina de escrever e digitar num computador, penso na grande diferença entre escrever de forma definitiva com cada letra sendo carimbada numa folha de papel e digitar textos inteiros para salvar, imprimir e editar quando quiser. Sem falar nas possibilidades de enviar para quem quiser e principalmente apagar um erro e refazer o que for necessário.

No Século XX, caso datilografássemos algo errado ao final de um texto, muito provavelmente usaríamos alguma forma entre as existentes para disfarçar o erro, pois datilografar tudo novamente sempre era uma tarefa muito trabalhosa. Hoje não precisamos mais disso e podemos alterar um texto da forma como for necessário, tornando-o cada vez melhor ou mais adequado à situação. Assim como os textos que datilografávamos no Século XX, nossas ideologias e posturas eram mais definitivas. Hoje, assim como nos textos digitais no computador, smartphones e tablets, nós mudamos de ideia tão rapidamente como editamos novos textos, seja por convicção, conveniência ou qualquer benefício.

A máquina de escrever é só um exemplo disso. Mas quase tudo tinha que ser feito de forma definitiva, pois não havia a grandiosa possibilidade digital de edição. Não tínhamos rascunhos e muito provavelmente levávamos este espírito para a vida pessoal e profissional. No início do Século XX, um fotógrafo que ia captar uma bela cena de uma família só tinha poucas lâminas de chapas de vidro para fotografar. Aquilo era mágico e único, para o fotógrafo e principalmente para quem era fotografado. Era um evento. Hoje, com a fotografia digital em maquinas fotográficas, celulares, tablets e outros dispositivos, captam-se tantos instantâneos que podem ser compartilhados com milhões de pessoas que o ato em si virou banal. Hoje, a cada dois minutos são captadas mais fotografias do que todas as imagens captadas no Século XIX, quando o método moderno de fotografia foi criado.

Outro exemplo vem da área do design e arquitetura, onde todos os projetos eram feitos sobre uma folha imaculada de papel vegetal com desenhos em nanquim. Qualquer grande erro forçava o desenhista a refazer todo o desenho. As ações eram mais calculadas para que os erros fossem minimizados. Assim como no desenho técnico, hoje de certa forma parecemos não planejar tanto nossas ações. É como se tivéssemos a nossa mercê a possibilidade de corrigir o problema como uma edição digital, mas estou me referindo a vida real. O digital está nos forçando a executar nossos atos sem planejamento prévio, expor nossas opiniões sem antes pensar nas consequências que podem reverberar em nós mesmos, nos que nos cercam e até mesmo em pessoas que nem conhecemos. Temos vários exemplos de pessoas que, por achar que a Internet é uma terra sem lei, dão opiniões ou provocam ações compartilhando-as nas redes sociais sem analisar suas consequências.

E se precisássemos ter convicções mais firmes, sem rascunho ou edição, assim como no Século XX e os séculos anteriores?

Claro que é ótimo que possamos mudar de ideia frente a um argumento diferente, uma forma de pensar, outro credo e uma escolha sexual, mas no Século XX a nossa civilização ainda era muito ligada a posicionamentos mais firmes, o que trazia também um caráter mais fixo e pouco volátil. É indiscutível que hoje temos mais liberdade de expressão, pelo menos nos países desenvolvidos e em desenvolvimento que não fazem parte de ditaduras e regimes totalitários, ditos democráticos.  Mas será que não precisamos aprender um pouco com o velho é famigerado Século XX, que nos deu tantas guerras, catástrofes e genocídios?

Já estamos na segunda década do século. Que tal fazer esta experiência de ter que planejar muito bem um texto e digitá-lo em uma máquina de escrever?

A banalização de nossos posicionamentos e a possibilidade de que possamos alterá-los rapidamente acaba por nos tornar mais suscetíveis a líderes forjados para nos manipular, seja nos ambientes de trabalho, nas famílias e principalmente na política.

Em certa forma e em alguns aspectos, temos muito a aprender com os séculos que deixamos para trás. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário